O CONVENTO DE «CORPUS CHRISTI»
 
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Esta antiga casa religiosa foi fundada por D. Maria Mendes Petite, mãe de Pedro Coelho (103), que foi ministro do Rei D. Afonso IV e avó de D. Leonor Alvim, que foi esposa do heróico D. Nuno Alvares Pereira.
A sua fundadora, por escritura de 11 de Outubro de 1345, doou as casas e igreja que mandara edificar, em Gaia, às Donas Pregaretas da Ordem de S. Domingos para se fazer ofício divino a serviço do corpo de Jesus Cristo.
Tendo o Cabido da Sé do Porto protestado contra o funcionamento desta nova casa religiosa, só em 12 de Abril de 1354 é que, por breve pontifício, nela entrou a sua primeira prioresa, a soror Marinha Afonso Lobato, com outras monjas vindas do convento das Donas Pregaretas, de Santarém.

Neste convento foi sepultada, no ano de 1387, ao lado de sua avó, falecida em 1355, D. Leonor Alvim, mãe de D. Beatriz Alvim Pereira, que foi esposa do primeiro duque de Bragança, D. Afonso, filho bastardo do Rei D. João I e de Inês Pires (104).
Em 1404, na capela de Santiago, deste convento, também foi sepultado Álvaro Anes de Cernache, alferes - more da Ala dos Namorados, em 14 de Agosto de 1385, na gloriosa batalha de Aljubarrota.
Este denodado herói acompanhou o Rei D. João I à conquista de Ceuta, onde foi armado cavaleiro pelo mesmo soberano.
Também foi senhor de Gaia Maior (105), e o fundador da actual casa Campo Belo

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Por Decreto de 28 de Maio de 1834, foram extintas as ordens religiosas; e, por isso, este mosteiro somente poderia subsistir até ao falecimento da sua última freira.
Todavia, para evitar-se o encerramento deste mosteiro e, muito principalmente, o exercício do culto, foi constituída, em 14 de Janeiro de 1882, a Confraria de Nossa Senhora do Rosário e S. Domingos de Gusmão.

Em 5 de Janeiro de 1894 faleceu a sua última freira (D. Marcelina Cândida Viana.); mas a confraria conseguiu manter o culto até ao ano de 1922, data em que foi dissolvida por ordem do Governo, sob o pretexto de que as salas das aulas em que era ministrado o ensino primário por senhoras piedosas, não tinham a indispensável higiene.
O convento foi, pois, encerrado; todavia, por diligências do então governador civil, o brigadeiro Sr. Luís Nunes da Ponte, coadjuvado pelo Sr. Dr. Joaquim Dinis da Fonseca e outras pessoas, conseguiu que neste extinto convento se instalasse o Instituto Feminino de Educação e Regeneração, que foi inaugurado, no dia 9 de Janeiro de 1930, pelo bispo do Porto, D. António Meireles.

Tão prestante como humaníssima instituição é, desde o seu início, dirigida pelas religiosas Irmãs do Bom Pastor.
Presentemente, depois das grandes obras realizadas em todo o edifício e igreja deste antigo mosteiro gaiense, pode afirmar-se que, no género, é o mais importante estabelecimento do país.

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As águas do rio Douro, por ocasião de cheias, invadiam as celas do convento de Corpus Christi, chegando, nas cheias de 1652 e de 1739, a penetrar na igreja, a ponto de obrigarem a retirar o Sacramento.
Por tal motivo foi construído o edifício actual com os dormitórios mais altos. No entanto, na cheia de 23 de Dezembro de 1909, as águas do Douro chegaram e entrar na igreja a uma altura de 0,20 m.

Chegou a ter cerca de setenta religiosas professoras; mas as recolhidas e criadas ascendiam a mais de duzentas (107).
Especializaram-se no fabrico de arroz-doce, que tão saboreado foi pelos vates e poetas que acorreram às festas dos abadessados realizadas no largo outeiro do convento de Corpus Christi.
Durante um quarto de século funcionaram no convento de Corpus Christi escolas do ensino primário para ambos os sexos, chegando as matrículas de ambas a ascenderem a mais de 400.
Ás crianças mais pobres era dada uma sopa diária, bem como roupas às mais necessitadas.

D. Camila Júlia de Almeida Braga, que foi admitida, neste convento, ainda criança, foi a desvelada enfermeira das últimas monjas desta casa religiosa: D. Clara Emília do Nascimento e D. Marcelina Cândida Viana, derradeira vigária da mais vetusta casa religiosa nas terras de Gaia.
Depois, tomando a seu cargo a direcção das escolas, chegou a vender todos os seus bens para as poder sustentar.
E, quando ela, por ordem da autoridade, teve de deixar, no ano de 1922, a sua cela, tal desgosto teve que, apenas, sobreviveu 48 horas na casa em que foi recolhida.

Quem, presentemente, contemple o edifício do antigo mosteiro de Corpus Christi de Gaia, deverá bendizer a hora em que ele foi escolhido para servir de glorioso troféu à divina virtude da Caridade e, consequentemente, para proveito próprio da humanidade bem atestada na missão que sublima os trabalhos do Instituto Feminino de Educação e Regeneração.

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Foi prioresa deste mosteiro a madre Catarina da Glória, que viveu 120 anos.
Tinha entrado para este mosteiro com a idade de seis anos.

As monjas do mosteiro de Corpus Christi foram muito celebradas pelos mais famosos improvisadores e insignes vates na ocasião de festas realizadas no espaçoso outeiro desta casa religiosa.

No ano de 1897 foi demolido um passadiço, que ligava o actual edifício do convento com os armazéns de Miguel Sousa Guedes.
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(103) Por o rei D. Pedro o considerar como um dos principais autores do assassinato de D. Inês de Castro, foi barbaramente morto, diante do mesmo soberano, em Santarém, no dia 18 de Janeiro de 1357.

(104) O actual duque de Bragança. D. Duarte Nuno, neto do rei D. Miguel I, é descendente directo, em linha varonil, do primeiro duque de Bragança.

(105) O senhorio de Gaia-a-pequena pertenceu a Aires Gonçalves de Figueiredo, que foi o último alcaide do Castelo de Gaia.

(107) A falecida Maria Adelaide – vulgarmente designada por Santa Maria Adelaide, sepultada em Arcozelo, foi serva neste convento durante bastantes anos.

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